Os três últimos episódios de “Pacto Brutal – O Assassinato de Daniella Perez“, sobre o rumoroso caso da morte da filha de Gloria Perez, já estão disponíveis na HBO Max e contam os detalhes do crime e da investigação que levou à prisão de Guilherme de Pádua e Paula Peixoto (à época, Paula Thomaz).
Durante o terceiro capítulo, uma complexa questão é explicada: o depoimento de frentistas que presenciaram o ator emboscando o carro de Daniella e dando um soco na atriz, que a deixou inconsciente. Os dois eram colegas de elenco da novela “De Corpo e Alma”, escrita por Gloria.
No entanto, segundo consta na série documental, ir atrás das testemunhas e convencê-las a depor não foi algo fácil e dependeu de muito esforço e diversas tentativas da dramaturga para se concretizar.
Tudo começou durante a noite do enterro de Daniella Perez, quando Gloria recebeu um telefonema anônimo que dizia: “Se quiser saber o que aconteceu com a sua filha, vá ao posto Alvorada, ao lado da Tycoon [estúdio de gravações usado pela Rede Globo à época]”.
A escritora pediu a um amigo que fosse ao local indicado e, quando ele voltou, disse que “alguma coisa realmente aconteceu”, porque ninguém que trabalhava no posto de gasolina queria falar sobre o assunto: todos fugiam. Na mesma época, o advogado de Guilherme de Pádua deu uma entrevista e disse que os frentistas apenas “viram os carros passando”, informação conflituosa, pois o local é longe da estrada e seria muito difícil identificar os veículos e quem estava dirigindo.
Para ajudar a entender o que poderia ter acontecido, a família da vítima foi atrás de algumas crianças que tiraram fotos com Daniella e Guilherme na saída do estúdio. Como eram fãs, o grupo pediu para que seguissem os carros dos atores, mas o motorista parou quando viu que eles entraram no posto de gasolina.
O crime aconteceu em 28 de dezembro de 1992 e, em janeiro do ano seguinte, Gloria Perez foi procurada por um cozinheiro que costumava ficar perto do posto Alvorada conversando. Ele foi a primeira pessoa a contar à escritora que sua filha tinha sido agredida e tinha desmaiado. Posteriormente, ela foi colocada desacordada dentro do carro. Em uma ligação gravada, ele conta que a atriz teria dito “que brincadeira é essa?” ao então colega de novela. No entanto, este homem não quis depor na polícia.
Depois da revelação, a autora ia todos os dias no posto de gasolina para tentar descobrir mais detalhes, mas nenhum frentista falava com ela e o gerente do local se recusava a dar mais informações. Ele chegou até mesmo a arrancar páginas de um livro de controle que continha os detalhes sobre funcionários que poderiam ter presenciado a agressão e também enviou o cheque que Daniella usou para pagar a gasolina para outro posto.
Enquanto procurava por respostas, a mãe da vítima encontrou um senhor que era vigia do local e pediu detalhes a ele. “Eu não sei o nome deles, mas eles moram aqui, nas comunidades da Barra. Um deles é gago e outro eu acho que se chama Daniel”. Com essas informações, Gloria Perez foi às comunidades todos os dias para conseguir descobrir quem eram esses homens que teriam testemunhado o soco.
Por que se recusaram?
A autora perguntava a todos da comunidade se conheciam algum frentista gago que morasse no local, até que uma pessoa reconheceu o perfil. Foi então que Gloria chegou a Dagmar de Almeida Bastos, mãe de Flávio Bastos, o ex-funcionário do posto.
“Eu fiquei assustada, com medo [ao ver a escritora]. A parte fraca era eu”, diz a mulher na série. Para Gloria, Dagmar justificativa: “Se fizeram isso com a sua filha, sendo a senhora quem é, imagina o que farão com o meu. E não sai nem no jornal”. “Eu sabia que ela estava certa”, concluiu a autora.
Eu tinha medo de represália. Porque, eu vou te falar, com os outros é fácil, comigo não. A gente que não entende muito de negócio de justiça, é muito difícil confiar.
Dagman de Almeida Bastos
Foi então que a autora teve uma ideia para chamar a atenção de Dagmar. “Um dia, eu vi que ela tinha uma filha e eu levei as fotos da perícia. Ela bateu a porta na minha cara de novo, e eu botei as fotos debaixo da porta. Ela abriu. Eu implorei para a Dona Dagmar”. As imagens convenceram a mulher que deixou o filho falar. “Eu senti pena dela”, disse.
Então, Fábio contou o seu lado da história. Por ter problemas em sua dicção, ele era uma pessoa muito tímida, mas foi convencido ao ver o álbum com as fotos de Daniella, o que mexeu com ele. O ex-frentista conta que reconheceu a atriz que vivia Yasmin em “De Corpo e Alma”, e se recorda que, depois, viu o ator de Bira dando um soco nela e dirigindo o carro de Daniella. Ele não viu Paula no local, mas entende que não era possível que o carro do assassino fosse conduzido sem que outra pessoa estivesse presente.
Ao final dos depoimentos, fica claro que o medo de sofrer represálias foi o que impediu que todos falassem e denunciassem Guilherme de Pádua.
O lavador de carros
Além dos frentistas, um lavador de carros chamado Antonio Clarete também estava envolvido na história, pois ele é quem tinha higienizado o veículo de Guilherme depois do crime. Uma vez com o nome e endereço, a autora foi mais uma vez tentar descobrir o que tinha acontecido.
Assim como os funcionários do posto de gasolina, ele estava com medo de falar com as autoridades e sofrer algum tipo de vingança. Para persuadi-lo, Gloria Perez descobriu que o homem é evangélico e pediu ajuda da deputada federal Benedita da Silva, que também seguia a religião, e o pastor da Igreja que o homem frequentava.
Mesmo sendo pressionado por todos, Antonio não queria falar. Até que a autora chamou a polícia e ele foi escoltado até a delegacia para depor. Às autoridades, ele contou que o casal levou o carro para lavar na noite do crime. Paula tentou se esconder, enquanto Guilherme estava visivelmente nervoso.
Por fim, ele conta que o carro tinha algo vermelho que saia junto com a água do pano e também reconheceu o assassino. Segundo o promotor responsável pelo caso, o depoimento do lavador ajudou a desmantelar a tese da defesa de que o crime foi um acidente.
Por que era importante?
Os depoimentos dos frentistas e do lavador de carro eram importantes pois ajudaram na tese de que não se tratava de um crime passional, e sim premeditado, pois envolvia inclusive uma emboscada.
Assim, não haveria também mais especulações de por que Daniella Perez teria ido até o local se encontrar com o ator, afinal ela estava desacordada. Como os horários, datas e detalhes batiam, a acusação conseguiu ser mais assertiva.